Portugal de futuro

31-12-2012 17:05

 

Nestas alturas surgem frequentemente balanços sobre o que de positivo e negativo ocorreu ao longo do ano. Se olharmos para a evolução da economia em 2012, é fácil tirar conclusões, dada a evolução do PIB, da taxa de desemprego e de alguns indicadores sociais. Para 2013, é também óbvio o que irá ocorrer, sendo as "surpresas" negativas previsiveis por qualquer economista de bom senso. Contudo, uma análise mais micro permite concluir que há áreas que se têm mostrado mais resilientes aos efeitos da conjuntura económica. Uma dessas áreas são os chamados "serviços intensivos em conhecimento" (KIS, em Inglês), e que são desenvolvidos, quer por empresas quer por entidades de investigação e desenvolvimento (I&D) nacionais. 
 
Uma forma de analisar a evolução dos KIS é através da Balança de Pagamentos Tecnologica, que é elaborada e disponibilizada publicamente pelo Banco de Portugal, e que permite analisar mensalmente as exportações (créditos) e importações (débitos) destes serviços entre Portugal e outros países.
 
Ou seja, a balança de pagamentos tecnológica constitui um instrumento para a compreensão e análise das transações relacionadas, nomeadamente, com a troca de conhecimento técnico e serviços de conteúdo tecnológico entre entidades pertencentes a diferentes territórios. As transações encontram-se registadas em diversas rubricas da balança corrente e de capital.
 
A balança de pagamentos tecnológica inclui as operações entre residentes e não residentes relativas a: 
  • Direitos de aquisição e utilização de patentes, marcas e direitos similares: encontram-se registados os pagamentos e os recebimentos internacionais referentes a: contratos de franchising; exploração de direitos de autor, de patentes e de marcas; aquisição/venda de activos intangíveis, tais como, patentes, licenças, copyrights, marcas, franchisings ou outros contratos transferíveis;
  • Serviços de assistência técnica: transacções entre residentes e não residentes relativas a serviços de arquitectura, engenharia e consultadoria técnica.
  • Serviços de investigação e desenvolvimento (I&D): englobam as transações entre residentes e não residentes respeitantes à investigação de base, à investigação aplicada e ao desenvolvimento experimental de novos produtos e processos.
  • Outros serviços de natureza técnica: são incluídos os serviços de consultadoria em hardware e software, os serviços de tratamento de dados e outros serviços informáticos (nomeadamente, serviços de reparação e manutenção de equipamentos informáticos e serviços de pesquisa), os serviços agrícolas, os serviços mineiros e os serviços industriais.
 
Tradicionalmente, Portugal sempre apresentou um saldo negativo na balança de pagamentos, ou seja, importava mais serviços intensivos em conhecimento do que exportava. O saldo era negativo todos os anos em muitos milhões de euros, demonstrando a fragilidade do nosso tecido produtivo e das nossas instituições ligadas ao conhecimento. Contudo, esta situação inverteu-se em 2007, com Portugal a apresentar (pela 1ª vez) um saldo positivo na balança de pagamentos tecnológica. Na altura em que isto ocorreu havia a expectativa, de quem estava envolvido na definição das políticas de inovação, de saber se esse tinha sido um ano de excepção ou se a tendência se iria manter nos anos seguintes. Se se mantivesse esta inversão de tendência, seria sinal de que as politicas públicas de estímulo Inovação e à I&D empresarial estariam a ter impactos económicos relevantes. 
 
De facto, passados 5 anos desse momento historico, podemos facilmente constatar esse impacto positivo, dado que entre 2007 e 2012 os saldos foram sempre positivos, com excepçao do ano de 2010. Para estes resultados destaque-se o esforço e o investimento público continuado em termos de Inovação e de I&D, nomeadamente através de iniciativas como os incentivos fiscais à I&D, a criação de infraestruturas tecnológicas, o desenvolvimento de parcerias internacionais em ciência e tecnologia, a procura pública orientada para a aquisição de serviços intensivos em tecnologias ou o estímulo à criação de spin-offs e de start-ups, que contribuiram para o desenvolvimento de serviços intensivos em conhecimento e de competências nacionais competitivas a nível global (estas iniciativas, bem como o ambiente macroeconómico que existia, estimularam tambem o investimento das empresas em I&D, que duplicou entre 2005 e 2010).
 
Apesar de não haver ainda os dados definitivos para o ano de 2012, os dados conhecidos permitem concluir que este será, talvez, o ano em que existirá um maior saldo positivo para Portugal em termos de balança de pagamentos tecnologica (€230 milhões até Outubro de 2012).
 
Contudo, torna-se possivel efetuar uma análise pormenorizada ao que se passou em 2011:
  • Em 2011, a Balança de Pagamentos Tecnológica registou um saldo positivo de €76,15 milhões, recuperando do saldo negativo registado em 2010 (único ano negativo, a que não será alheia a crise internacional).
  • Portugal exportou em 2011 cerca de €1,3 mil milhões de euros em serviços intensivos em conhecimento, mais 14,3% do que em 2010. Significa isto que, apesar do difícil contexto económico e financeiro em Portugal, as empresas mais intensivas em conhecimento continuaram a aumentar o seu nível de competitividade nos mercados internacionais. 
  • Se olharmos para as componentes da Balança de Pagamentos Tecnológica, constatamos que se registou um saldo positivo nos “serviços de assistência técnica” e nos “serviços de investigação e desenvolvimento”. Por seu lado, na rúbrica “direitos de aquisição e utilização de patentes, marcas e direitos similares” o saldo é negativo, existindo uma diferença considerável entre os créditos e os débitos registados.
 
Estes dados permitem constatar uma realidade conhecida no sistema nacional de inovação (e que recentemente foi demonstrada no recente relatório da UTEN/FCT): existe ainda um baixo nível de valorização económica dos resultados da investigação que se produz, quer pelas empresas quer pelas entidades do sistema científico e tecnológico.  
 
Neste âmbito, entre outras iniciativas, é claro que se torna essencial estimular uma maior competitividade das empresas nacionais no que respeita à propriedade intelectual, nomeadamente no que se refere aos contratos de franchising entre empresas nacionais e estrangeiras, de exploração, licenciamento e vendas de patentes e de marcas, de copyrights e de outros contratos transferíveis. 
 
Este constitui um dos maiores desafios para os próximos anos em termos de política de Inovação, fazer com que o esforço nacional dos últimos anos se traduza em maior valor económico e social. Se assim for, podemos afirmar que o futuro de Portugal passa por aqui!